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Dispensa de licitação no Saae favorece ‘esquema’ de propinas, dizem servidores

Para obter propinas, agentes públicos estariam propositalmente quebrando máquinas e equipamentos a fim de obterem contratos de locação dos materiais e compra de novos produtos; Prefeitura não responde ao Porque

Paulo Andrade (Portal Porque)

Servidores do Saae (Serviço Autônomo de Água e Esgoto) de Sorocaba afirmam que a política de dispensas de licitações da autarquia para fazer compras, revelada pelo Portal Porque, tem gerado supostas “facilidades” no recebimento de propinas. Esses servidores, que preferem não ser identificados por temerem represálias, revelam que o suposto esquema seria comandado por um grupo que atua em vários setores do Saae, especialmente no de eletromecânica. No último domingo, o Porque mostrou que todas as compras feitas pela autarquia este ano, que somam R$ 20 milhões, foram feitas sem licitação (leia aqui).

“Quebram equipamentos de propósito para poder ganhar propina com aluguel”, denuncia um servidor. “Inutilizam motores para poder mandar consertar e ganhar ‘aquele cafezinho’ com isso”, complementa. “Detonam peças para poder enviar para usinagem terceirizada. Tudo errado”, desabafa o funcionário público ao Portal Porque. Por conta dos equipamentos “quebrados”, o Saae pode fazer compras emergenciais, o que possibilita a dispensa de licitação, liberando a Prefeitura para comprar os produtos e contratar os serviços da empresa que ela bem escolher.

As supostas práticas de suborno ou propina na autarquia vêm sendo discutidas inclusive em grupos de servidores do Saae no Whatsapp, alguns dos quais a reportagem teve acesso. Abaixo de um vídeo compartilhado da vereadora Iara Bernardi (PT) sobre o despejo de esgoto no rio Sorocaba, um servidor comentou: “A hora que souberem que isso começou com a ganância do setor de manutenção para poder quebrar e gerar dinheiro para o bolso da chefia…vai dar m****”.

Segundo uma das fontes que falou diretamente com a reportagem, os três ou quatro líderes do grupo são comissionados ligados diretamente ao prefeito Rodrigo Manga (Republicanos). “Não foi por mérito que eles chegaram no posto de chefia que ocupam. São comissionados ou gratificados por indicação política”, reclama.

A reportagem do Portal Porque tem investigado essas denúncias há duas semanas. Ouvimos pelo menos uma dúzia de fontes dentro do Saae e todas confirmam o esquema. O Porque tem cobrado uma explicação da Prefeitura para essas acusações desde a última sexta (19). A Secretaria de Comunicação do Paço, no entanto, se recusa a responder nossas perguntas. Caso o Governo Manga resolva dar satisfação sobre a acusação desse esquema de corrupção no Saae, esta matéria será atualizada.

O esquema
Uma das fontes ouvidas pelo Portal Porque afirma que as denúncias do suposto esquema de corrupção foram feitas semanas atrás para o então diretor-geral do Saae, Tiago Suckow. Mas logo depois, em 12 de abril, Tiago foi exonerado e quem assumiu o comando geral do Saae foi Alfeu Malavazzi, empresário e amigo antigo do prefeito. Tiago, por outro lado, foi nomeado como chefe de gabinete da Secretaria de Desenvolvimento.

Outra fonte ouvida pelo Porque, que trabalha em uma Estação de Tratamento de Esgoto, também está ciente da existência de esquema e da deterioração de máquinas e equipamentos do Saae. Para ele, a intenção do prefeito Manga é “sucatear para privatizar”, nos moldes do que o governador Tarcísio vem fazendo com a Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo).

“Manga não vai privatizar este ano por causa das eleições. Mas se ele ganhar, no ano que vem, preparem-se”, prevê o servidor.

Outro servidor ouvido pela reportagem, que também diz ver casos de propina acontecendo rotineiramente, discorda quanto à privatização. “Não vão matar a galinha dos ovos de ouro de muita gente. Ano passado foram R$ 400 milhões em arrecadação. Este ano deve ser mais [R$ 455,9 milhões previstos]”.

“Teve caso de um comissionado esquecer bolsa com R$ 35 mil em dinheiro dentro do carro do Saae. Sabemos de outro chefe, que comprou um terreno de R$ 60 mil em um condomínio, também em dinheiro. Se isso não é propina. Não sei o que é”, afirma uma das fontes entrevistadas.

De acordo com o servidor, são conhecidos casos também de propinas envolvendo licitações (pregões eletrônicos ou presenciais). Recentemente, uma metalúrgica de Sorocaba teria perdido o contrato para uma empresa de São Paulo, mesmo a fornecedora local oferecendo o mesmo valor. “Agora a logística complicou, as peças demoram a chegar. Um dos donos da empresa local admitiu para mim que a troca foi ‘muito estranha’. Ou seja, foi concorrência dirigida. Mas, sem licitação, fica muito pior”.

Prefeitura não responde
Além de tentar ouvir a Prefeitura, a reportagem também procurou ter acesso a eventuais processos administrativos que poderiam tratar dessas suspeitas, mas esses processos correm em segredo, não constam no Portal da Transparência e, novamente, o governo Manga omite-se diante das perguntas e acusações.

No domingo, 21, o Portal publicou reportagem relevando que o Saae gastou R$ 20 milhões em compras de janeiro a 20 de abril de 2024 sem que houve nenhuma licitação: 100% das aquisições foram consideradas emergenciais e dispensaram licitação.

Nesta terça-feira (23), 100% das compras do Saae continuavam sem licitação. Desde a apuração de domingo, foi acrescentado um contrato com dispensa de licitação, no valor de R$ 5.817 para serviços de conserto e manutenção. O valor total, que no domingo era R$ 20.002.475,48; passou para R$ 20.008.292,48.

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