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Desassoreamento do rio Sorocaba destrói o ecossistema e não soluciona enchentes

Especialista afirma que processo usado pela Prefeitura de Sorocaba elimina organismos que vivem no fundo do rio, além de ser ineficiente a médio e longo prazo

Maiara Beatriz (Portal Porque)

Processo de desassoreamento do rio Sorocaba começou em 2022 e já passou por diversas etapas. Foto: Divulgação/Prefeitura de Sorocaba

O desassoreamento do rio Sorocaba, ação executada pela Prefeitura desde 2022 com o objetivo de combater os alagamentos, é um paliativo para situações de urgência, mas tratando-se de médio e longo prazo, é como “enxugar gelo”, além de destruir o ecossistema do rio, afirma André Cordeiro, professor da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos) Sorocaba e presidente interino do CBH-SMT (Comitê de Bacia Hidrográfica Sorocaba e Médio Tietê).

Para Cordeiro, a dregagem (processo de escavação dos sedimentos) é uma destruição completa do ecossistema, pois elimina a comunidade de seres que vivem no fundo do rio, chamada bentônica, composta por diferentes organismos, como os invertebrados. Também se destrói lugares como toca de peixe ou de sobrevivência de organismos que são anfíbios, como sapos e outros tipos de animais.

“No Rio Sorocaba, você tem peixe, em algumas regiões, tem tartarugas, tem outros animais que, provavelmente, ou fugiram, se tinham a capacidade para fazer isso, ou foram mortos no processo de dragagem”, explica o especialista, que ressalta ser esse o principal efeito negativo da ação de desassoreamento realizada pela Prefeitura.

Além disso, quando se aprofunda a calha, a velocidade do rio diminui, pois a água que passava por um espaço menor acaba fluindo por um espaço maior. “Com a redução da velocidade, você aumenta a sedimentação. Então o desassoreamento é como se fosse ‘enxugar gelo’. Você tira o sedimento, só que você cria ambientes mais profundos que facilitam a sedimentação. Então quanto mais sedimento você tira, mais sedimento vai parar no rio num próximo momento”, revela Cordeiro.

Por isso, o especialista afirma que esta não é uma solução que deva ser usada com muita frequência, pois não resolve o problema das enchentes a médio e longo prazo. “Na verdade, criam-se bolsões de sedimentação que muitas vezes levam a novos períodos de enchente. A partir do momento que você retira [os sedimentos], você precisa começar a tirar o tempo inteiro, porque vai acumular mais do que tinha originalmente.”

Cordeiro também explica que drenagem de rio se faz no período de seca e não no período de chuva justamente para evitar que o sedimento volte para o rio logo em seguida. “Aqui [a drenagem] foi feita principalmente no período de chuva, então muito do sedimento que foi tirado já voltou para o rio e já está formando bancos de areias, às vezes no mesmo ponto que foi retirado.”

Soluções
Para Cordeiro, o ideal para a situação de sedimentação é impedir que os rios pequenos que chegam ao rio Sorocaba tragam consigo o sedimento de outras regiões. “Quando você permite que um empreendimento se localize no topo de um morro ou nas regiões mais altas, você aumenta a liberação de sedimento para as regiões mais baixas. Então, quando a gente fala em gestão desse tipo de situação, gestão de recursos hídricos, a gente tem que pensar de cima para baixo, ou seja, das regiões mais altas para as regiões mais baixas”, afirma o especialista.

Para ele, deve-se, portanto, reduzir o desmatamento nas regiões mais altas, além de resolver pontos onde haja infiltração de água ou que impeçam o escoamento superficial e o carregamento de partículas e de sedimentos. “Então as obras que são feitas na calha do Rio Sorocaba não vão impedir enchentes nos próximos períodos de chuva e em alguns casos podem até piorar a situação.”

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