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Justiça obriga Dylan Dantas a retirar publicações por conter discurso de ódio e preconceito

Vereador teria até esta terça-feira para retirar das redes sociais o conteúdo sobre sua intervenção na Escola Estadual Prof. Joaquim Izidoro Marins, mas posts foram mantidos

Maíra Fernandes (Portal Porque)

Print de tela feito às 17h35 desta quarta-feira, 5: vereador ainda não removeu conteúdos considerados homofóbicos pela Justiça. Foto: reprodução/Facebook Dylan Dantas

A Justiça determinou que o vereador Dylan Dantas (PSC) retire de suas redes sociais as publicações sobre sua intervenção na Escola Estadual Prof. Joaquim Izidoro Marins, em junho de 2022, quando o vereador, acompanhado de dois assessores, foi averiguar pessoalmente um (em suas palavras) “casamento e beijo lésbico” — na verdade, um “selinho” trocado entre duas alunas, durante uma apresentação teatral.

A decisão foi tomada no âmbito de agravo de instrumento com pedido de liminar, impetrado por duas funcionárias da escola, contra decisão anterior do Judiciário, que havia rejeitado o pedido de exclusão das publicações feitas pelo vereador. Com isso, a decisão anterior foi reformada.

No entendimento da 1ª Turma do Colégio Recursal da 19ª Circunscrição Judiciária em Sorocaba, publicada na última sexta-feira, 30, as publicações contêm discurso de ódio e preconceito homoafetivo por parte de Dantas. De acordo com a decisão, o vereador tem cinco dias – que vencem nesta terça-feira, 4 — para retirar as publicações ou pagar multa diária no valor de R$ 300,00.

Até o momento em que esta notícia foi publicada, na tarde desta quarta-feira, as publicações sobre a intervenção do vereador na escola continuavam publicadas em sua página do Facebook.

A ação liminar que determinou a retirada das publicações por entender que elas ofendem moralmente a instituição e o corpo docente da escola, a população LGBTQIA+ e caracterizam discurso de ódio por parte do parlamentar.

“No mérito, melhor compulsando os autos, verifico que, a despeito de não mencionar nomes e embaçar as imagens, as publicações têm caráter de discurso de ódio, ao mencionar como motriz da ação do vereador a investigação de um evento escolar em que aconteceu um ‘casamento lésbico’, ‘para não prevaricar’ (fls. 31)’”, pondera a decisão, que prossegue: “Com efeito, a publicação que menciona o motivo da atuação do vereador, tal como acima transcrito, inverte a lógica do ordenamento jurídico nacional, dando caráter criminoso à união homoafetiva.”

A decisão deixa clara que as opiniões proferidas pelo vereador esbarra nos pilares da democracia como o respeito a todas as formas de sexualidade e a prevenção ao discurso de ódio.

O julgamento deu provimento ao recurso das funcionárias da escola, por maioria de votos, em conformidade com o voto da relatora, Tamar Oliva de Souza Totaro, e teve a participação dos juízes Leonardo Guilherme Widmann, Márcio Ferraz  Nunes e André Luís Adoni.

A reportagem tentou contato com o vereador Dylan Dantas, por meio de sua assessoria de imprensa, para comentar a decisão da Justiça. Até o fechamento deste texto, não houve retorno. Caso entrem em contato, o texto será atualizado.

Passada de pano entre pares

Ação similar foi protocolada na Comissão de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara de Sorocaba, tanto por membros da sociedade civil como por entidades como a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), logo depois do episódio.

No entanto, em um processo que se arrastou por cerca de cinco meses, os colegas de Câmara não tiveram o mesmo entendimento do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) e arquivaram o assunto, sem imputar nenhuma penalidade ao vereador.

No início de dezembro, o então presidente da comissão, vereador Cristiano Passos (Republicanos), em resposta a questionamento da vereadora Fernanda Garcia (Psol), explicou que a demora para conclusão do processo e a opção por não penalizar o colega foi baseada em decisão judicial que não entendeu a intervenção de Dantas na escola estadual como invasão, pois, segundo a argumentação, não usou de formas ilícitas para acessar o local, tendo entrado pela porta da frente e, de acordo com o vereador, com a anuência do responsável pela unidade.

Tanto Fernada Garcia quando Iara Bernardi (PT), ambas vereadoras que estiveram na escola e denunciaram a ação de Dantas, repudiaram a decisão da comissão à época.

O que dizem as postagens

Nas postagens nas redes sociais, o vereador afirma que teria sido agredido por sindicalistas e militantes da esquerda, fato esse que, segundo a decisão judicial, é impossível de provar no vídeo veiculado.

Ele também fala sobre o motivo que o levou até a escola, sem que houvesse sido convidado, quando os alunos realizavam uma representação artística. “Recebi denúncias de alguns pais e fui apenas verificar o ocorrido, representei o deputado estadual Douglas Garcia na visita. Na saída da sala fui hostilizado por sindicalistas e um monte de gente que gritavam palavras de ordem. Tentaram tomar meu celular quando comecei a gravar a agressão seguida de empurrões e tapas na mão. É preciso ressaltar que com a direção não houve problemas, a conversa foi produtiva”, escreveu ele, versão já desmentida em relatos dos professores e profissionais da escola.

“O motivo da visita foi referente a denúncias de alguns pais da realização de um evento onde ocorreu um casamento e beijo lésbico. Para não prevaricar fui verificar o ocorrido para entender, e fui informado que foi algo voluntário dos alunos e sem ativismo da direção”, concluiu.

Relembre o caso

Na data em que se celebrava o Dia do Orgulho LGBTQIA+, 28 de junho, o vereador conservador Dylan Dantas e assessores adentraram na escola estadual, que havia realizado uma ação artística ocorrida um pouco antes, quando duas alunas-atrizes protagonizaram um “selinho” no término de uma apresentação teatral.

Na verdade, tratava-se de uma cena de casamento, em que, por falta de um menino que representasse o noivo, uma menina caracterizou-se como tal. E ao final do casamento, as meninas trocaram um “selinho” improvisado, dentro do contexto da cena, e sem combinação prévia com os responsáveis pela apresentação.

O beijo, segundo o PORQUE apurou, à época, não constava do roteiro da apresentação, tendo sido incorporado pelas próprias alunas-atrizes. Também foi esclarecido que o evento foi idealizado para destacar a produção cultural dos alunos, e não em alusão ao Dia do Orgulho LGBTQIA+.

De acordo com os relatos protocolados nas representações contra o vereador, Dantas chegou acompanhado de assessores, sem solicitar autorização, filmando tudo e, de maneira descrita como hostil, perguntando quem eram a diretora e a professora responsáveis pela encenação.

“Eles entraram na sala da diretora inquirindo, querendo saber o responsável pelo espetáculo, e a professora saiu de lá chorando”, conta uma das fontes, que preferiu não se identificar.

Dantas deixou o local praticamente expulso pelos alunos e debaixo de xingamentos. O parlamentar foi chamado de homofóbico por estudantes, que, em determinado momento, gritaram em coro: “Lixo! Lixo!”

O vereador, que em sua página no Facebook afirmou ter sido “agredido”, esteve no local, de acordo com sua versão, para atender ao chamado de alguns pais.

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