Busca

Enquanto proíbe Carnaval, Manga libera show gospel que causa estragos no Jardim Botânico

Evento, que resultou na gravação do DVD da cantora evangélica Vanilda Bordieri, reuniu centenas de pessoas, inclusive o próprio prefeito que, um mês atrás, proibiu o Carnaval no Parque das Águas

Fábio Jammal Makhoul e José Carlos Fineis (Porque)

O prefeito de Sorocaba e missionário evangélico, Rodrigo Manga (Republicanos), proibiu o Carnaval no Parque das Águas, mas liberou o Jardim Botânico para a realização de um show gospel, na sexta-feira (12) passada, que contou, inclusive, com a presença do chefe do Executivo. O evento, que resultou na gravação do DVD da cantora evangélica Vanilda Bordieri, reuniu centenas de pessoas e deixou um rastro de destruição e muito lixo no parque.

Considerado uma das principais reservas ecológicas de Sorocaba, o Jardim Botânico é um “importante centro de conservação da biodiversidade”, que tem como principal objetivo “proteger e preservar as espécies locais e regionais da flora, além de servir ao lazer, cultura, pesquisas acadêmicas e educação ambiental”, segundo o site da Prefeitura.

O show gospel realizado na noite de sexta passada vai à contramão de todos esses objetivos. A gravação do DVD evangélico no Jardim Botânico contou com uma megaestrutura de palco, que abrigou, além da cantora Vanilda Bordieri, uma orquestra sinfônica e a equipe de produção. As torres de iluminação também chamaram a atenção pelo tamanho.

A quantidade de caminhões que entraram e saíram do parque para montar e desmontar a estrutura causaram impactos ambientais, conforme fontes do próprio Jardim Botânico ouvidas pelo Portal Porque.

As fotos tiradas no fim de semana após o show (veja na galeria, no início da reportagem) mostram a quantidade de lixo deixado pelas, no mínimo, 300 pessoas que participaram do espetáculo evangélico no Jardim Botânico.

Para realizar um evento nos parques de Sorocaba, o organizador precisa enfrentar uma legislação bastante restritiva. Mas segundo fontes da Secretaria Municipal de Meio Ambiente ouvidas pelo Porque, a gravação do DVD gospel no Jardim Botânico teve sua realização facilitada, já que não houve, nem mesmo, um estudo de impacto ambiental.

O Regulamento Interno dos Parques Municipais, em seu artigo 10, determina que o “Zoológico e Jardim Botânico de acordo com a vocação de cada um deles e utilidade pública das comunidades que o frequentam dará prioridade para o entretenimento e os eventos, atividades e ocorrências voltadas à Educação, Cultura, Esportes, Lazer e Meio Ambiente”, o que não é o caso do show gospel.

O mesmo artigo diz em seu parágrafo único que “é atribuição das Áreas de Gestão Ambiental e Zoobotânica em conjunto com a Educação Ambiental autorizar os eventos, podendo interferir nas propostas sempre que julgar pertinente e útil para os parques, Zoológico e Jardim Botânico e seus visitantes”.

Já o artigo 11 determina que, “para a realização de eventos e atividades, por terceiros, os interessados deverão enviar requerimento de solicitação descrevendo a natureza do evento, seu objetivo, público esperado, data, horários de funcionamento, espaços requeridos, entre outros”.

No ano passado, o prefeito Rodrigo Manga editou um decreto para modificar o Regulamento dos Parques e concentrou a entrega dos requerimentos e a decisão de expedir alvará para eventos em seu gabinete.

A Secretaria de Comunicação da Prefeitura se recusa a dar informações ao Porque. A reportagem, no entanto, recorreu à Lei de Acesso à Informação e fez uma série de perguntas sobre a realização do evento gospel. A Prefeitura tem prazo de 20 dias para responder as questões.

Carnaval, não pode!

Um mês atrás, o prefeito evangélico impediu que a Acusa (Associação Cultural do Samba de Sorocaba) realizasse o Carnaval no Parque das Águas, programado para 21 de abril. Além da enorme burocracia que o Governo Manga impôs aos organizadores, ainda determinou que não poderia ser utilizada a denominação “Carnaval”, tanto no Parque das Águas, como em nenhum material de promoção e de divulgação. A festa havia sido transferida de fevereiro para abril por conta das fortes chuvas no período carnavalesco.

O Porque produziu uma série de reportagens sobre a proibição do Carnaval. Numa delas, as entidades de defesa da cultura negra repudiaram a posição do governo municipal e acusam o prefeito Manga de impor empecilhos para a realização da festa fora de época em Sorocaba.

Em nota, o presidente interino do Compir (Conselho Municipal de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra e Promoção da Igualdade Racial), José Marcos de Oliveira, classificou o ato de perseguição ao Patrimônio Imaterial.

“O problema não é o Carnaval, o problema é a grotesca interferência político-religiosa no Estado, na política de Estado e, mais grave ainda, sem nenhum constrangimento em desrespeitar os princípios da laicidade, da história e da cultura afro-brasileira”, reclamou o presidente Conselho de Comunidade Negra.

LEIA TAMBÉM:
>> Prefeitura de Sorocaba impede associação de realizar eventos ligados ao Carnaval

>> Entidades de defesa da cultura negra repudiam posição de Manga sobre o Carnaval

>> Descaso com Carnaval é ‘porta de entrada’ de desmonte cultural em Sorocaba

mais
sobre
Carnaval Estado laico evangélicos gospel Governo Manga Manga preconceito
LEIA
+