O prefeito de Sorocaba e missionário evangélico, Rodrigo Manga (Republicanos), proibiu o Carnaval no Parque das Águas, mas liberou o Jardim Botânico para a realização de um show gospel, na sexta-feira (12) passada, que contou, inclusive, com a presença do chefe do Executivo. O evento, que resultou na gravação do DVD da cantora evangélica Vanilda Bordieri, reuniu centenas de pessoas e deixou um rastro de destruição e muito lixo no parque.
Considerado uma das principais reservas ecológicas de Sorocaba, o Jardim Botânico é um “importante centro de conservação da biodiversidade”, que tem como principal objetivo “proteger e preservar as espécies locais e regionais da flora, além de servir ao lazer, cultura, pesquisas acadêmicas e educação ambiental”, segundo o site da Prefeitura.
O show gospel realizado na noite de sexta passada vai à contramão de todos esses objetivos. A gravação do DVD evangélico no Jardim Botânico contou com uma megaestrutura de palco, que abrigou, além da cantora Vanilda Bordieri, uma orquestra sinfônica e a equipe de produção. As torres de iluminação também chamaram a atenção pelo tamanho.
A quantidade de caminhões que entraram e saíram do parque para montar e desmontar a estrutura causaram impactos ambientais, conforme fontes do próprio Jardim Botânico ouvidas pelo Portal Porque.
As fotos tiradas no fim de semana após o show (veja na galeria, no início da reportagem) mostram a quantidade de lixo deixado pelas, no mínimo, 300 pessoas que participaram do espetáculo evangélico no Jardim Botânico.
Para realizar um evento nos parques de Sorocaba, o organizador precisa enfrentar uma legislação bastante restritiva. Mas segundo fontes da Secretaria Municipal de Meio Ambiente ouvidas pelo Porque, a gravação do DVD gospel no Jardim Botânico teve sua realização facilitada, já que não houve, nem mesmo, um estudo de impacto ambiental.
O Regulamento Interno dos Parques Municipais, em seu artigo 10, determina que o “Zoológico e Jardim Botânico de acordo com a vocação de cada um deles e utilidade pública das comunidades que o frequentam dará prioridade para o entretenimento e os eventos, atividades e ocorrências voltadas à Educação, Cultura, Esportes, Lazer e Meio Ambiente”, o que não é o caso do show gospel.
O mesmo artigo diz em seu parágrafo único que “é atribuição das Áreas de Gestão Ambiental e Zoobotânica em conjunto com a Educação Ambiental autorizar os eventos, podendo interferir nas propostas sempre que julgar pertinente e útil para os parques, Zoológico e Jardim Botânico e seus visitantes”.
Já o artigo 11 determina que, “para a realização de eventos e atividades, por terceiros, os interessados deverão enviar requerimento de solicitação descrevendo a natureza do evento, seu objetivo, público esperado, data, horários de funcionamento, espaços requeridos, entre outros”.
No ano passado, o prefeito Rodrigo Manga editou um decreto para modificar o Regulamento dos Parques e concentrou a entrega dos requerimentos e a decisão de expedir alvará para eventos em seu gabinete.
A Secretaria de Comunicação da Prefeitura se recusa a dar informações ao Porque. A reportagem, no entanto, recorreu à Lei de Acesso à Informação e fez uma série de perguntas sobre a realização do evento gospel. A Prefeitura tem prazo de 20 dias para responder as questões.
Carnaval, não pode!
Um mês atrás, o prefeito evangélico impediu que a Acusa (Associação Cultural do Samba de Sorocaba) realizasse o Carnaval no Parque das Águas, programado para 21 de abril. Além da enorme burocracia que o Governo Manga impôs aos organizadores, ainda determinou que não poderia ser utilizada a denominação “Carnaval”, tanto no Parque das Águas, como em nenhum material de promoção e de divulgação. A festa havia sido transferida de fevereiro para abril por conta das fortes chuvas no período carnavalesco.
O Porque produziu uma série de reportagens sobre a proibição do Carnaval. Numa delas, as entidades de defesa da cultura negra repudiaram a posição do governo municipal e acusam o prefeito Manga de impor empecilhos para a realização da festa fora de época em Sorocaba.
Em nota, o presidente interino do Compir (Conselho Municipal de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra e Promoção da Igualdade Racial), José Marcos de Oliveira, classificou o ato de perseguição ao Patrimônio Imaterial.
“O problema não é o Carnaval, o problema é a grotesca interferência político-religiosa no Estado, na política de Estado e, mais grave ainda, sem nenhum constrangimento em desrespeitar os princípios da laicidade, da história e da cultura afro-brasileira”, reclamou o presidente Conselho de Comunidade Negra.
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